Por que temos que combater o reacionarismo?

 

Há algum tempo uma crescente onda de reacionarismo cresce e se estende pelo Brasil, revelando-se em centros urbanos com ataques às pessoas pretas, LGBTQIAP+ e instituições governamentais, e também nas áreas rurais, dizimando florestas, envenenando águas e perseguindo povos indígenas.

Essa onda de reacionarismo é histórica, ganhou muita força no país através de movimentos de ultra direita que se difundiram pelo Brasil na era Vargas com maior ênfase. Esses grupos atuam sob a lógica fascista materializada por Mussolini e amplamente difundida por Hitler. Sim, os ideias fascistas no Brasil estão crescendo e muito.

Esses movimentos de ultra direita elegem uma parcela da população como prioritária de direitos e exclui o restante, essa parcela privilegiada é composta por homens brancos, de classe média-alta, cristãos, cisgêneros e heterossexuais. Essa normativa social é imposta sobre todo o restante da sociedade através de discursos ardilosos e propositalmente confusos com conceitos sumariamente arcaicos. E esses indivíduos tornam-se fiscais da população e acabam fazendo o papel de vigia, carrasco e executor pelo Estado.

Nosso país, em tese, é democrático. Ou seja, todo cidadão tem o direito de se expressar, seja através de sua orientação sexual, sua cultura étnica, seus ideais políticos e até religiosos, desde que essa expressão não viole o direito de liberdade de outrem e sua dignidade, mas isso fica só no papel mesmo. Qualquer indivíduo que foge da normativa social (patriarcal, misógina, lgbtfóbica, capitalista, racista, capacitista, heterossexual e capacitista) é visto como um indivíduo insurgente, um perigo para o equilíbrio social, um mau exemplo que deve ser imediatamente eliminado.

As crescentes ondas de violência estão atreladas a esse paradigma social, basta ver nos gráficos de vítimas para se ter uma noção. As estatísticas ainda apontam que a maioria dos assassinatos que ocorrem no Brasil, são crimes de ódio; feminicídio, lgbtfobia, racismo e intolerância política. 

O governo atual é dos maiores propagadores de desinformação, ódio, preconceitos e corona vírus, vale ressaltar. Não é por acaso que muitas pessoas que sempre estiveram no patamar privilegiado abriram suas asas após esse presidente assumir o poder. Pessoas que guardavam seus preconceitos velados, hoje, escancaram na internet toda sua verborragia misógina, lgbtfóbica, racista e capacitista, pois, sabem que estão propagando o que o governo diz e faz, ou seja, estão em acordo com os ideias governamentais.  

Recentemente um grupo de políticos da direita se uniu para proibir o uso da linguagem neutra em órgãos públicos e privados. Sabe o quão grave isso é?

Vejo alguns "intelectuais" que se dizem de esquerda se opondo à linguagem neutra porque dizem que isso vai destruir, ou descaracterizar o idioma. Bem, esse é o mesmo argumento usado pela direita, algo tem de errado aí. Direita e esquerda usando o mesmo discurso para se opor à mesma coisa? Alguém está no caminho errado. Acontece que os ditos "esquerdistas" que lutam contra a linguagem neutra, não passam de reacionários enrustidos, e querem se apresentar como minoria quando na verdade fazem parte dos privilegiados.

Quando uma pessoa se opõe à forma de comunicação de outrem, ela está se opondo à existência dessa pessoa, à forma como a pessoa se sente confortável para se expressar. Vale lembrar que a própria constituição oferece a todas as pessoas o direito de se expressarem como são, através dos meios que lhe são cabíveis. Há dois meses uma juíza no sul do país deu permissão a uma pessoa para que colocasse em sua certidão o gênero neutro, e a explicação dela foi simplesmente baseada na constituição e no direito de se expressar. Ela disse que quando uma pessoa é impedida de se autodeterminar não-binária, esse impedidor está sendo anticonstitucional. Ou seja, toda reação à nãobinariedade e a linguagem neutra é por si anticonstitucional, reacionária e ultradireitista. Sem nenhum tipo de ressalvas.

Quando os políticos determinam a proibição da linguagem neutra, estão impedindo pessoas de serem quem são e se comunicarem devidamente. Sabe quem fez isso no Brasil antes? Pombal. Sim, as reformas pombalinas acabaram com diversas línguas nativas e proibiu o uso do tupi como forma de comunicação, as inúmeras reformas instituídas pelo marquês de Pombal atacaram não só uma língua, mas várias, e não é segredo para ninguém que os portugueses são genocidas declarados, não existe justificativa para o que fizeram e o mundo inteiro concorda com a hediondosidade desses atos.

Bem, será que esses privilegiados (brancos, cisgêneros, héterossexuais, homens etc) relacionam suas defesas com as desses genocidas? Porque é impossível não perceber a semelhança das ações. Defender a proibição de uma linguagem (que é uma ferramenta tecnológica humana e essencial para seu desenvolvimento) é impedir uma pessoa de ser quem é e de se comunicar de acordo com sua realidade. Ou seja, é um puro reacionarismo fascista.

É preciso ter muito cuidado com os discursos que escutamos e reproduzimos. Porque ao mesmo tempo em que se defende a proibição do gênero neutro e o uso da neolinguagem, defende-se ideais fascistas e historicamente genocidas, como: impedimento de expressar-se, historicamente, culturalmente e socialmente. Então se você se considera uma pessoa do bem, revolucionária e libertária, preste mais atenção ao que defende e ao que se opõe, o Cis-tema é mestre em ludibriar as pessoas com suas doces artimanhas para nos colocar uns contra os outros e nos transformar em fiscais do tradicionalismo.

Resumindo, ou você é revolucionário e apoia todas as causas antisistêmicas ou você é indubitavelmente, reacionário. 

Sem mais.

Pricila Elspeth