domingo, 25 de abril de 2021

Querido diário,

 


É angustiante a sensação de desejar alguém que possa lhe ouvir.

É difícil querer algo que não exista, é alimentar seu egoísmo.

Alguém para escutar o que digo, não só agora, mas em todo o porvir.

Sei que dizendo assim, parece que quero alguém dobrada ao proselitismo.

Mas quem de nós se entristece em comunhão com seu próprio hedonismo? 


Esse poema acima foi escrito num momento bastante angustiante, no qual eu me sentia solitária. Mas é um tipo de solidão diferente daquela que você sente quando está literalmente sozinha num lugar. Esse tipo, é daquele que você se sente sozinha enquanto conversa com alguém. Captou?

Algo que me atrai muito é a inteligência. Me atrai de distintas formas, é uma admiração surreal, por vezes me sinto romanticamente atraída por pessoas muito inteligentes, e algumas vezes é uma coisa mais profunda, mais abstrata, é como se fosse um tesão da alma, entende?

Desde que mudei de escola a primeira vez, não sentia esse tipo de coisa, mas no decorrer dos últimos meses (por assim dizer) isso tem mudado. 

Eu sinceramente não consigo ter prazer numa conversa com a maioria das pessoas com quem verbalizo, mas vivemos em sociedade e essa comunicação superficial e ensaiada se faz necessária. Não suporto responder coisas óbvias, como: Está quente hoje, né? O ônibus está cheio, né? Vieram bastantes alunos, né?... Esse tipo de coisa me estarrece num nível profundamente molecular, sinto minhas mitocôndrias se digladiando para não terem que fornecer energia para as células relacionadas aos mecanismos de comunicação.

E isso é horripilo, pois não é intencional, é um mecanismo natural. E inúmeras vezes a pessoa começa falar de BBB e eu fujo na minha mente para revisitar Rousseau, Kierkegaard, Nietzsche, Guin, Asimov e etc. Não é por mal, mas não consigo manter esse nível de comunicação. Tá e daí?

O ruim disso é que, quando encontro alguém verdadeiramente inteligente, e não papagaios de piratas, eu me sinto como se estivesse perdida no meio do oceano e vendo uma boia a que me agarrar. E isso muitas vezes me faz agir precipitadamente. Faz, porque estou num processo de aprendizagem, mas melhorei bastante. Antes era muito intenso, bem, esse antes não faz tanto tempo assim. rsrsrs

Há quase um ano, cruzou no meu caminhou uma pessoa que de cara se mostrou especial. No entanto, isso ficou adormecido, ficou no campo da gentileza, da admiração profissional, e okay, sem problemas. Não tinha contato com a expressividade dessa pessoa, com as ideias que ela valorizava. Mas aí de repente, tive esse contato através das redes sociais. Ual! Ual! e Ual!

Era tanta informação, tanta identificação, tanta coisa parecida, tanto a explorar, que me vi perdida em outro mar. Mas nesse eu não via boia, ao contrário, estava largada, completamente náufraga. E estava amando isso. Cada conversa era uma porção a mais de identificação, só que essa admiração cresceu demais e se tornou algo muito difuso, abstrato, inominável, para mim. Na misera tentativa de racionalizar o que estava sentindo, pensei em enquadrar as sensações e os sentimentos numa palavra elencando características... E deu o quê? Paixão. Ô lasqueira! Mas quanto mais eu falava com a pessoa, mais essa admiração crescia, e aí tive de mudar a nomenclatura. É isso mesmo... Amor. AAAAAAAAHHHHHHH!!!!!

Há muito tempo eu buscava uma pessoa com quem pudesse conversar livremente, e unindo essa ansiedade com a carência da pandemia, nossa, atirei no pé. Comecei a alimentar esse sentimento de amor e da minha forma tímida tentava demonstrar, mas falhava miseravelmente todas as vezes. Acho que a pretensão de ir com calma me atrapalha de demonstrar o que verdadeiramente sinto pelas pessoas, isso as vezes é bom, mas em outras situações mais específicas, não. Bem, o que aconteceu, foi que eu me entreguei a esse amor platônico e não consegui me conter por um bom tempo. Parecia uma adolescente no Ensino Médio amando pela primeira vez.

Bom, investiga daqui, investiga dali, vi que não ia rolar uma aproximação tal como queria, ou no caso, como eu achava que queria. E aos poucos fui pensando sobre isso, sobre essa entrega, sobre essa necessidade, sobre essa carência e compreendi que realmente fui precipitada. Não era amor de fato, mas uma profunda atração pela intelectualidade, pelos valores que essa pessoa carrega. Okay.

Consegui entender isso. Respirei fundo, não com os pulmões, mas com a alma. E quando esse respiro novo aconteceu, foi que percebi que a sumidade é o que mais me atrai. E é incontrolável, essa atração não é física, não é sexual, não é possessiva... É uma oblação, compreende? Que por vezes desperta chaminhas no coração, mas isso é outra história.

O fato é que, esses dias, tive uma conversa com essa pessoa. Falamos de coisas comuns, hahahaha, não, não essas coisas comuns, sobre estudos, sobre projeções de futuro, sobre linguagens, enfim... Ao término, eu fiquei deitada olhando para o teto e refletindo sobre o conteúdo da conversa, e cheguei a uma conclusão. Tal como eu, a pessoa também se atrai por essa característica, isso foi demonstrado durante meses, e por não ter alguém confiável com quem conversar, alguém compreensível, tentou agarrar-se à boia no oceano. Eu não consegui perceber antes, não mesmo. Bom, tudo bem, percebi que ela tem a mesma necessidade de ser ouvida, de poder se expressar, algo que até é difícil para ela, e foi nesse momento que toda a admiração mudou de tom, ficou mais forte, porém, num sentido de colaboração. Juntas, poderemos falar e ouvir, poderemos nos expressar e assistir à expressões e sem medo de ser rasas propositalmente para agradar simplesmente. Entende o quão isso é maravilhoso?

Bem, e hoje aconteceu algo semelhante com outra pessoa. Depois de uma semana cheia de diálogos vazios, conversei com uma pessoa incrível durante horas, as divagações se alinhavam e encontravam seu próprio caminho, como tem que ser. rsrsrs

E cada fala, cada pontuação, ponderação e questionamento era imensamente prazeroso. Mas um prazer insubstancial, indizível... Quis permanecer na conversa por mais mil anos, mas ela teve de sair. rsrsrs 

Depois dessa conversa, novamente sentei para pensar, para alinhar meus pensamentos e comparar a sensação orgástica com a qual saí da conversa, com a sensação que sentia pela outra pessoa, e ambas eram iguais. Eu fiquei pasma comigo mesma. Eu ponderei sobre isso quase que a tarde toda até me satisfazer com o resultado de tais elucubrações. 

A inteligência é afrodisíaca, no mais benéfico sentido da palavra, ela desperta prazer, desperta paixão, e até amor. Mas o que eu percebi é que gosto desse contato com pessoas inteligentíssimas, não um contrato, gosto delas, as amo, algumas em todos os sentidos, mas que esse não é e nem deve ser o objetivo de tal contemplação, entende? Quero conversar livremente. E aí, nesse interregno entre o fim da ponderação e o início desse texto, vasculhei minhas coisas em busca desse poeminha. Ele foi escrito numa fase de angústia solitária, mas ainda faz sentido, porém, de outra forma.

Só para finalizar... Li muito sobre uma condição atrativa denominada Sapiosexualidade e acho que se encaixa muito bem para mim. Não gosto só de academismo, títulos, mas inteligência orgânica, inteligência autêntica, inteligência fluida... Entende? Bem, com tudo isso, percebi o quão é importante para mim esse tipo de contato, no entanto, percebi a contraparte dessa atração. A maioria das pessoas não são assim, geralmente são dominadas por dogmas, discursos políticos ensaiados, ou lemas de para-choque de caminhão... E foi aí que me dei conta de que terei ainda mais dificuldades para me relacionar com as pessoas daqui para frente. Sim, pois, se o fato de ser trans já limita a maior parte das possibilidades, com uma sapiosexualidade compreendida, puts! Não é que eu me ache superior a alguém, claro que não. Mas quando me atraio por pessoas por conta de outras características, ainda me fica esse vazio, e em alguns momentos, determinadas companhias se tornam enfadonhas, difícil de ser apreciada. Quero falar de algo, mas a pessoa não entende, não gosta, não quer saber. Saber o que te faz feliz é essencial para viver feliz, já dizia Spinoza... Ai ai, como é triste. E o pior de tudo, hoje, só tenho quatro pessoas com quem posso conversar livremente e expressando todo o conteúdo que tenho, pois somente essas quatro pessoas vão entender e gostar disso, E por isso eu não as deixo em paz, estou sempre ali, marcando presença, atiçando a fornalha, o que muitas vezes pode ser mal compreendido e gerar um afastamento. Bem, estou aprendendo a nadar ao lado das boias para não precisar me agarrar a elas com toda a voracidade náufraga que trago dentro de mim. É isso.


Beijos da Pri! ^^

      









8 comentários:

  1. Sapiosexualidade é interessante.
    A maior parte das pessoas conversa porque sente prazer ao se expressar, a gente sente prazer em aprender, em ver o mundo de formas diferentes.
    Infelizmente quando mais aprendemos mais chatos nos tornamos, mais exigentes ficamos, esse efeito é um tanto quanto elitista, mas acho que não tem uma forma de evitar.

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    1. Sim amigo, sim. É mega interessante, é mega prazeroso.
      Mas é nocivo também, porque com o passar do tempo, nós tendemos a não sentir mais prazer na comunicação tacanha, e aí é onde somos tomades pela angústia.
      Ah, eu não diria elitista, mas é limitante para nosso prazer sim.
      Tenso, né?

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  2. Não tecerei comentários, mas acho que sei quem é uma dessas pessoas. kkkkkkkkkkkkk

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  3. Ah gata eu sei que é difícil, mas se a gente só falar com pessoas do mesmo nível que a gente, a gente cai numa rotina também e fica igualmente insuportável.
    As vezes, respirar é bom.
    Mas eu entendo você, é frustrante mesmo. Ainda bem que você não é hétero, senão vc ia ver o que é lidar com burrice.

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    1. Eu sei disso, mas é incontrolável.

      hahaha eu imagino, de verdade. A maioria dos homens são um desastre em comunicação empática.

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  4. Eu sei que é difícil amore, mas não sei até onde podemos ser seletivas a esse ponto, consegue entender?
    Em algum ponto você tem que ceder. Não dá para encontrar a pessoa perfeita.

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    1. Eu sei que não existe uma pessoa perfeita.
      Mas o que eu disse é que a atração romântica e sexual fica condicionada, não é algo que possa controlar.
      E não tem como ser menos seletiva. É natural.

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