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segunda-feira, 23 de maio de 2022

Ghost writer compensa?

 


Bem, é uma questão que merece alguns apontamentos, então, vamos lá.

Ghost writer é literalmente uma profissão fantasma. Esse termo designa a pessoa que escreve uma obra e recebe pelo serviço de escrita, mas quem publica e colhe os frutos da publicação é outra pessoa. Em termos mais simples, o escritor fantasma jamais terá seu nome associado ao que escreve.

Talvez você esteja se perguntando, porquê alguém desejaria trabalhar disso. Bem, as vezes não é um desejo, mas uma consequência da vida. Muitos escritores fantasmas são pessoas que escrevem bem, que tem experiência com redação, revisão etc, mas não possui conhecimento suficiente para fazer uma obra sua vingar no mercado literário, é o tipo de pessoa que venderia poucas cópias sem ter como retirar seu sustento disso.

Algumas pessoas que se propõem a trabalhar como ghost writer não almejam a fama, querem só ter um emprego e trabalhar com o que gostam, que é a escrita. E para essas pessoas, ver sua obra publicada, mesmo que assinada por outro nome, já é satisfatório.

Uma coisa é certa, para ser um escritor fantasma você tem que ser uma pessoa bem resolvida, estar ciente de todo o processo e que existe um contrato de trabalho, que se rompido pode lhe render um processo e muita dor de cabeça.

Falando em termos financeiro, compensa?

Tudo depende do contrato. Veja bem, sempre vai existir um contrato melhor que o outro, sempre vai existir uma encomenda que você goste mais de produzir e que seja mais lucrativa que outras. Mas e aí, dá para viver disso?

Dá... Naquelas. Depende de quão bem recomendada é a pessoa para outras interessadas em seus serviços. 

Uma pessoa há um tempo atrás veio até mim dizendo que simpatizava com meu trabalho e com minha escrita, e que queria propor algo para mim, de início achei que fosse uma parceria, mas não era. Quando ela me falou que queria me contratar como escritora fantasma dela, fiquei meio receosa, mas como era uma pessoa por quem tinha alguma consideração, topei o trampo.

Ela tinha algumas ideias a respeito de um livro, que no decorrer da conversa virou uma saga. Tratamos de prazos e valores e como eu disse, era uma pessoa por quem tinha uma simpatia, então tudo ficou na informalidade, eu não tinha pretensão de fazer disso minha carreira, mas confesso que quando recebi a grana fiquei bem feliz.

O processo todo durou quase dois anos, a produção de alguns livros de sua saga foi extremamente cansativo e me sugou até os ossos, sempre tinha algo para ser alterado, não porque fazia sentido para a trama, mas porque ela queria assim.

Depois de terminados, ela postou os livros em várias plataformas para atrair leitores. Ela tem uma grana para investir em propaganda e o fez, logo os livros estavam com muitas leituras e comentários. Aliás, algo que percebo é que as pessoas adoram puxar o saco de quem se mostra com dinheiro, autores que não ostentam, ficam no anonimato, fato. Enfim...

Recebendo diversas opiniões, essa pessoa veio até mim pedindo para alterar várias partes do texto porque estava surfando as ideias dos leitores que a todo momento sugeriam algo que os agradasse mais, eu expliquei que fazer isso era um erro, pois ia comprometer o andamento da história toda, mas ela não quis ouvir. Alterei, novamente na camaradagem, pois achava que o que havia recebido era justo.

Essa pessoa alcançou uma editora e publicou sua saga, e até vendeu bem no começo, mas a medida que os leitores vão notando os cortes que ela fez depois, as alterações mal planejadas, as vendas deram uma caída, mas esse é outro assunto. O lance é que, eu ganhei uma grana, mas me comprometeu para sempre.

Hoje, eu não consigo criar uma nova voz para meu estilo narrativo de fantasia. Tudo o que eu escrevo tem o mesmo tom e isso é péssimo, pois se uma obra fantástica minha cair nas graças do povo, vão achar que eu me inspirei nela, quando na verdade fui eu quem escrevi.

E percebendo isso, foi que comecei conversar com algumas pessoas que vivem de escrita fantasma, muitas passam por isso, outras são desmotivadas pela falta de credibilidade que as editoras nacionais têm para com os autores brasileiros, elas não acreditam no potencial das obras, só querem nomes feitos que já se vendem sozinhos, propiciando ainda mais o mercado da escrita fantasma. 

Esse foi o ponto decisivo para eu desistir da ideia. Não quero sacrificar minha voz narrativa de sci-fi, drama e romance, quero viver delas, mesmo que não alcance esse sonho, vou mantê-lo vivo enquanto puder.

Mas a escrita fantasma não é de todo má. Você pode escrever TCCs, projetos, teses, dissertações e até livros, se o que importa para você é só o dinheiro na conta, mas como disse antes, você precisa estar bem resolvida com essa questão. 

Então no final das contas, o que conta é o que você pretende para o futuro do que você escreve. conheço alguns ghost writers que são felizes com o que fazem, já outros que são atormentados com seus boletos e lamentam terem entrado nesse mundo, pois não conseguem mais sair.

É isso, espero que não tenha plantado uma sementinha da dúvida em vocês.

Beijos e até o próximo!

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