A transição de adequação de gênero ocorre quando uma pessoa se dá conta de que não pertence ao gênero ao qual foi designada e então decide transicionar para o gênero que lhe corresponde.
Algumas pessoas entendem por transição, o período em que a pessoa passa se ocupando de processos estéticos, cirúrgicos e/ou hormonais em função da adequação de gênero. Outras pessoas dizem que a transição se dá durante o período de questionamento e conclusão sobre a qual gênero a pessoa pertence, e outras ainda, dizem que para pessoas trans, a transição nunca tem fim.
Eu gosto de pensar que existe um início, um meio e um fim, tal como Preciado e Butler citam.
Penso que a transição se inicia no momento em que o indivíduo se dá conta de que seu gênero está em desconformidade com o gênero que lhe atribuíram. Então, todas as ações que vierem depois disso, farão parte da sua transição: cada descoberta, cada questionamento, cada reação, cada escolha, cada acessório, cada pesquisa e sentimentos desenvolvidos em decorrência dessa questão, tudo isso faz parte da transição.
Por transição, compreende-se a jornada que uma pessoa trans faz até atingir seu objetivo, ou seja, até estar adequada ao gênero com o qual se identifica. Essa adequação nada tem a ver com processos cirúrgicos, estéticos e etc, mas sim construções mentais. E esse tempo é peculiar a cada indivíduo. Não existe medida para saber quanto tempo dura uma transição.
Eu por exemplo, comecei minha transição em 2014, quando comecei a questionar minha cisgeneridade compulsória. À partir desse momento, comecei buscar mais informações e cada pesquisa me afastava cada vez mais da figura cisgênera que eu representava, mas a qual nunca me representou. Essas pesquisas me colocaram em contato com pessoas trans, na maioria travestis que se hormonizavam por conta própria, sem nenhum parâmetro, apenas com coragem e dedicação. Elas tinham um objetivo físico a ser alcançado, pois o mental já haviam alcançado, eu ainda não. Depois de algum tempo conversando com inúmeras pessoas trans, percebi que nem todas recorriam à processos cirúrgicos ou à hormonização, apenas se expressavam como trans e apresentavam suas identidades à sociedade.
Admiro muito a nãobinariedade, a ausência da passabilidade e da escravidão estética. Em determinado momento me identifiquei como uma pessoa não binária com expressão de gênero feminino, e isso foi libertador e assustador simultaneamente. Sim, pois, não tinha muites amigues a quem recorrer em casos de dúvidas, e elas eram muitas.
Com apoio de ume amigue eu consegui chegar até uma UBS que tem um ambulatório voltado para o atendimento de pessoas trans. Lá passo em minhas consultas de rotina e foi lá que consegui minhas receitas para iniciar a hormonização e muita informação sobre o que eu estava fazendo e o que esperar de tudo isso.
Eu tenho a necessidade de me hormonizar, no entanto, não tenho a pretensão de conseguir um corpo perfeito, turbinado e tudo mais. Apenas me sinto feliz com as mudanças que ocorreram e as que previsivelmente ocorrerão. Sinto-me conectada comigo mesmo. Hoje, consigo me olhar no espelho e me ver, consigo entender que passei de uma fase de questionamentos, de insatisfação, para uma fase de adoração e harmonia comigo mesme, ou seja, transicionei. Então quer dizer que minha transição está concluída, não preciso de mais nada? Não é bem assim. Quero fazer alguns ajustes por sentir que é necessário para minha satisfação pessoal, mas não interferem mais na imagem que eu tenho de mim.
Então, eu vejo o início da transição no momento em que o indivíduo percebe que não é cisgênero. O meio é todo o caminho que esse indivíduo trilhará para alcançar seu objetivo; que é estar adequade ao gênero com o qual se identifica. E o fim da transição é o momento em que o indivíduo percebe que está adequado ao seu gênero, mesmo que ainda faltem alguns ajustes de cunho pessoal, mas o sujeito já se sente inserido no seu verdadeiro gênero, no seu eu interior. Depois disso, são apenas mudanças comuns pelas quais todos os corpos passam.
O caminho de uma vida trans dura para sempre, depois de iniciada a transição e compreendido seu gênero, a jornada só terá fim quando a vida abandonar o corpo, mas essa é a vida de qualquer pessoa, todes trilhamos esse caminho.
Esse caminho nos fortalece como pessoas, nos rende novas experiências, as quais só poderemos adquirir estando onde estamos, num corpo trans. E esse caminho não é uma transição, é uma vida a ser vivida por uma nova pessoa que transicionou. Entende?
Claro, essa é minha forma de ver a transição. Cada pessoa é livre para pensar de acordo com suas referências e construções mentais. Só acho que se entendermos que a transição não tem fim, estaremos dizendo para nós mesmes que nunca seremos quem desejamos ser, que o processo de transição é uma jornada infinita e que pessoas trans nunca se adequarão aos seus gêneros. Mas como disse, é minha forma de pensar, não precisa ser a sua.
É isso.
Beijos da Pri! ^^
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