Essa semana mais duas pessoas do meio artístico se declararam Não-Binárias, foram elas: Bárbara Paz e Demi Lovato. Isso é muito importante, se pararmos para pensar, nos últimos meses mais de dez pessoas famosas se declararam NB. Esse é um evento de proporções astronômicas e de suma importância para a comunidade LGBTQIAP+, sobretudo para a população NB.
Se você é novate por aqui e não sabe o que são esses termos, vou explicar rapidinho. Cisgênero é uma pessoa que ao nascer (na verdade bem antes) é definida como sendo pertencente a um gênero e quando cresce, e se desenvolve psiquicamente, continua se definindo tal qual foi feito ao nascer. Pessoas Não-Binárias são pessoas transgêneras, ou seja, ao nascer foram designadas como pertencente a um gênero, mas quando se desenvolvem psiquicamente, discordam do gênero que lhe fora atribuído ao nascer. Pessoas transgêneras são divididas em vários grupos, existem as binárias: Homem trans e mulher trans, e existem as não-binárias: Travestis, Queer, Bigênero, Gênero Neutro, Gênero Fluido, Agênero, etc.
Quando a maioria das pessoas cisgêneras sabem que terão uma criança, começam a especular o sexo do bebê para poder escolher enxoval, nome, decoração de quarto, brinquedos, roupinhas e etc. Repare que todas as especulações são feitas única e exclusivamente baseando-se no sexo, no aparelho genital, sabe aquele trequinho que serve para executar as necessidades fisiológicas? Pois bem, aquilo ali.
Sexo não é o mesmo que gênero. Sexo é a genital e ela está ali para determinar como você se reproduz, isso se for da sua vontade se reproduzir, e talvez a forma como você vai obter prazer nas relações sexuais, isso considerando que a pessoa não seja assexual estrito, ou que ela goste de usar a genital nas relações, porque como sabemos, sexo não é feito só com genitais. O corpo tem por volta de dois metros quadrados de pele, mas as pessoas se concentram em dez centímetros quadrados.
Bem, imagine uma criança que teve seu sexo revelado por uma ultrassom. E baseando-se nesse sexo a família escolhe nome, modo de vestir, pronomes de tratamento, brinquedos e como ela ira se comportar. Sim porque existem comportamentos ditos masculinos e existem os ditos femininos. Mas aí a crianças cresce e se desenvolve, e de repente ela percebe que todo aquele universo imposto sobre ela não lhe pertence, o que acontece? Ela se frustra.
Essa frustração pode crescer e atingir parte do desenvolvimento social e cognitivo da criança, caso não seja compreendida e sanada. Mas como sanar essa frustração? Aí é que mora o problema... Geralmente as famílias determinam o gênero da criança baseando-se no sexo, mas quando isso não se concretiza, elas se frustram e despejam sobre a criança uma cachoeira de imposições e lamurias. Algumas vezes, através de coerção faz a criança suprimir sua identidade e representar o papel que lhe foi imposto. Desnecessário dizer o quanto isso prejudica uma pessoa né?
Tá, mas porque que a cisgeneridade é uma imposição?
Existem vários países onde qualquer sexualidade diferente da heterossexualidade, é crime. Bem, nesses países existe um norma, um padrão a ser seguido. Certo? Muito bem.
Na sociedade em que vivemos é muito comum olhar para uma pessoa e classificá-la imediatamente como homem ou mulher baseando-se apenas na aparência, uma forma cristalizada e idealizada do que é homem e mulher. E junto com a identidade de gênero vem a sexualidade, se é homem, o "normal" é gostar de mulher e se é mulher o "normal" é gostar de homem. (Note as aspas no NORMAL, por favor.)
Se existe uma norma, um paradigma, então tudo o que foge dele é considerado subversivo, rebelde, afrontador, hediondo, errado etc... Certo? Pois bem. Percebe que padrões são imposições?
Dizem para as crianças quem elas são, como se portar, o que vestir, de quem gostar e como serão identificadas socialmente, diversas imposições. Se desde o nascimento uma criança é colocada dentro de um universo heterocisnormativo, sem direito a escolha, que outro nome daríamos a isso se não, coerção/imposição?
A transgeneridade é questionada e marginalizada porque ela foge à norma. As pessoas que estão adaptadas ao sistema, não suportam rupturas sistêmicas. Sabe por quê? Porque quando você se depara com uma ruptura na sua realidade, você precisa aceitá-la e se adaptar a ela. Adaptar-se quer dizer, livrar-se de seus pensamentos atrofiados, livrar-se de dogmas que te colocam num patamar privilegiado, livrar-se das regras sociais que te colocam no papel de opressor, e livrar-se de suas construções psíquicas tacanhas que não acompanharam a evolução da sociedade. Mudar dói, incomoda, dá trabalho, exige crescimento espiritual e mental, e é muito comum as pessoas quererem mudanças, mas não quererem passar por elas.
A cisgeneridade e a heterossexualidade não seriam imposições se a sociedade não baseasse toda a sua cultura, toda a sua produção e toda a sua normalidade nelas.
Todo o discurso familiar para uma criança é direcionado para seu sexo. Dizem que a criança irá se casar com alguém do sexo oposto, mas não dizem que ela se casará com uma pessoa de quem ela gosta. Percebe?
Todo padrão, toda normatividade é uma imposição, não importa o campo. Mas o que isso tem a ver com as pessoas se declarando NB.
Com a disseminação do conceito de nãobinariedade através das midias sociais, mais e mais pessoas começaram a perceber que não são binárias, não se percebem tal como as designaram ao nascer (ou antes) e ainda não se veem dentro de uma identidade binária: homem ou mulher. Isso derruba completamente a cisgeneridade como normalidade. Se as pessoas depois de crescerem e terem referências de outras identidades, se identificam com identidades não cis, é porque essa identidade lhe foi imposta. E isso acontece com muita gente, por isso, nos últimos meses tantas pessoas se declararam abertamente não-binárias.
Para ficar mais fácil faremos um exercício mental. Imagine uma criança que antes de nascer teve sua religião escolhida. Sim a família toda dessa criança fictícia é católica, e por extensão a criança também será. Bem, podemos afirmar com certeza que os dogmas católicos abrangem completamente a compreensão de mundo, os anseios e os valores dessa pessoa? Não, né? Tudo bem, vamos continuar. Ela cresce e muda de religião, digamos para o budismo, porque percebe que essa religião conversa mais com seu eu interior, é mais coerente para ela, lhe satisfaz mais que o catolicismo. Percebe que ela foi imposta a algo e depois teve de romper amarras sociais e familiares para poder seguir seu próprio caminho? Mas e se ao invés de determinar a religião dela, a família apresentasse uma vasta gama de religiões ao longo dos anos para essa criança e a deixasse livre para seguir a que mais lhe agradasse? Bem diferente não é?
Nossa sociedade impõe sobre as crianças a heterossexualidade e a cisgeneridade desde antes do nascimento e isso faz com que nossas crianças vivam parte de suas vidas interpretando papeis que não representam sua persona. Então para encerrar, podemos dizer que a heterocisnormatividade é uma violência, uma agressão contra a individualidade das pessoas.
Com isso não quero dizer que devemos impor a trangeneridade ou a nãobinariedade sobre as crianças, mas não defini-las como cis e nem como héteros. Devemos criá-las o melhor possível, ensinando-as a amar, a respeitar a vida, o planeta, os semelhantes e a elas próprias. Deixá-las livres para entender quem são e de quem gostam, sem impor esses padrões opressores sobre elas. Só assim a cisgeneridade deixará de ser uma imposição.
Beijos da Pri! ^^
Mais óbvio que isso não dá, perfeita explicação! Amei!
ResponderExcluirObrigada!
ExcluirPois é, não tem como ser mais óbvio.
Porra pri que texto foda. Gostei muito
ResponderExcluirObrigada! ^^
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